No artigo “Treinamento Baseado em Velocidade – Parte 2” veremos algumas formas de aplicar esse parâmetro dentro do treinamento físico.
O presente artigo não era dividido, optei por fazê-lo para facilitar o entendimento. Aos que não leram a primeira parte, confiram:
A predição de 1RM é válida e confiável?
Como força e velocidade têm uma relação muito próxima, quando uma aumenta a outra diminui (10-14), é possível, em certas circunstâncias, predizer 1RM em vários exercícios usando um método estatístico conhecido como “regressão linear” (5, 15).
(N.T: Em termos simples, a regressão linear é uma equação onde se estima o valor de uma variável, chamemos de x, a partir do valor de outra variável, chamemos de y. As duas variáveis têm um valor previsível. Se a variável x → força aumenta, sabemos que, em tese, a variável y → velocidade diminui proporcionalmente. Na estatística, um modelo de regressão linear simples é uma equação matemática que inclui somente duas variáveis e apresenta uma relação em linha reta entre elas, servindo para prever comportamentos com base na associação entre duas variáveis que geralmente possuem uma boa correlação).
Esse método de predizer 1RM demonstrou ter uma confiabilidade > 95% para o meio agachamento na Smith machine e para o supino tanto na smith machine quanto com peso livre (ambas variedades de supino feitas com pausa), quando usada a velocidade média propulsiva (16, 17).
Adicionalmente, o PUSH Band (um dispositivo usado no treinamento baseado em velocidade) mostrou predizer de forma confiável o pico de velocidade e de potência durante o salto com contramovimento, embora ligeiramente superestimado (18).
No entanto, outras pesquisas, uma feita com o exercício de agachamento com barra nas costas e outra com o supino na Smith machine, ambos usando a velocidade média concêntrica, reportaram que as medidas de velocidade não podem ser usadas para predizer de forma acurada o 1RM real (11, 12).
As razões para esses achados conflitantes com pesquisas anteriores são:
(N.T: Abaixo o agachamento e o supino com pausa).
Para esclarecer, o 1RM real é predito de maneira mais acertada quando se usam cargas mais pesadas, variações na Smith machine, velocidade média propulsiva e exercícios que incorporam uma pausa a fim de eliminar a contribuição do ciclo alongamento-encurtamento.
Quando o profissional está tentando predizer o 1RM real e não usa os pontos mencionados acima é provável que a predição não seja acurada. O que significa que tentar predizer usando o agachamento e supino padrões, com a velocidade média concêntrica não é recomendado.
Para fazê-lo, o profissional precisa primeiro desenvolver o perfil força-velocidade do atleta ao gravar as velocidades de movimento em cada carga (Ex.: 0,8 m/s com 60% de 1RM – ver figura abaixo).
Um perfil força-velocidade permite que o profissional facilmente veja quão rápido um atleta pode levantar uma carga em um determinado percentual de seu 1RM.
“Quando a carga do exercício aumenta, a velocidade do movimento diminui”.
O perfil força-velocidade é um método que usa uma série de repetições, com cargas relativas e absolutas, para produzir um perfil para um exercício específico. A figura a seguir mostra um perfil hipotético para o desempenho de um atleta no supino. Note que quando a carga/peso na barra sobe a velocidade diminui e vice-versa.
(N.T: Legenda da figura original: Perfil força-velocidade hipotético para o desempenho de um atleta no supino).
Atualmente é recomendado que os preparadores físicos meçam a velocidade média propulsiva em pelo menos 4-6 intensidades crescentes, usando cargas entre 45-95% do real ou estimado 1RM, como visto na figura acima (17).
Nota: Quanto mais pesadas as cargas, maior a acurácia da predição, devidos aos pontos levantados anteriormente.
A figura a seguir demonstra com mais detalhes como fazer o teste. Pesquisas prévias sugerem que a diferença de velocidade entre a carga mais leve (série 1) e a mais pesada (série 6) deveria ser de ao menos 0,5 m/s (5, 18).
(N.T: Abaixo a tabela com os dados originais da pesquisa que inspirou a adaptação da figura acima. A tabela contém os valores da velocidade média propulsiva e os respectivos percentuais de 1RM na execução do meio-agachamento na Smith machine. Ou seja, para este exercício em particular podemos usar estas velocidades como correspondentes aos valores percentuais de 1 Repetição Máxima.
Exemplo: Meu aluno faz um ½ agachamento na Smith machine com 92kg para 7 repetições e o valor da velocidade média na série fica em 0,50 m/s. Posso supor, com algum grau de certeza, que estou trabalhando a cerca de 75% de 1RM. Ou seja, aquela carga de 92kg corresponde a 75% de 1RM naquele treino).
Quando fizer um supino, por exemplo, é fundamental que o atleta tente mover a barra o mais rápido possível durante a fase concêntrica. A maior velocidade média propulsiva gravada durante cada carga deve ser usada para computar o perfil força velocidade (17).
Com isso em mente, os atletas deveriam ser encorajados a manter a boa técnica de execução e é trabalho do preparador assegurar-se de que isso ocorra. Assim, o profissional deve prestar atenção à técnica de execução dos exercícios.
A despeito do nome confuso, os limiares de velocidade mínima, também conhecido como Velocidade de 1RM, são na verdade bem simples. Limiares de velocidade mínima são a média da velocidade concêntrica produzida durante a última repetição bem sucedida.
Em outras palavras, é a velocidade média durante a fase concêntrica de 1RM.
(N.T: Para simplificar, é a velocidade média da última repetição da série).
É muito importante entender que esses limiares de velocidade mínima são específicos para cada exercício. Por exemplo, enquanto velocidades mínimas de 0,17 m/s foram reportadas no supino, velocidades de 0,52 m/s foram relatadas na puxada pronada (23). A figura a seguir mostra como a velocidade mínima difere entre 2 exercícios comuns: O supino e a puxada pronada.
(N.T: Abaixo o exercício da puxada, ou remada, pronada. Em inglês o termo usado foi “prone pull”, mas podemos encontrar “bench pull” ou, como no vídeo abaixo, “bench row”).
Nota: As velocidades mínimas circuladas em verde são os pontos mais baixos para cada exercício.
A informação indiscutivelmente mais útil relacionada aos Limiares de Velocidade Mínima é:
⇒ Os valores são consistentes e parecem ser os mesmos durante um teste máximo de 1RM ou a última repetição de um teste de repetições submáximas até a falha (24).
Por exemplo:
Izquierdo e colaboradores (24) descobriram que quando os sujeitos faziam repetições até a falha no supino e agachamento usando intensidades de 60, 65, 70 e 75% de 1RM, a velocidade mínima na última repetição era sempre a mesma. Também foi notado que a velocidade da última repetição dessas intensidades (60, 65, 70 e 75% de 1RM) era a mesma do teste de 1RM.
No geral isso sugere que a velocidade mínima na repetição final é a mesma, independente se está se realizando um teste submáximo de repetições até a falha concêntrica (Ex.: 9RM) ou um teste máximo de 1RM.
Isso significa que a velocidade média concêntrica durante o teste de 1RM pode ser calculada usando um teste de repetições até a falha. A figura abaixo demonstra como os limiares de velocidade mínima são os mesmos, durante um teste de 1RM e um de repetição até a falha concêntrica. Ambas velocidades mínimas estão circuladas em verde.
As tabelas a seguir mostram como os limiares de velocidade mínima permanecem similares para variações de um determinado exercício, mas são muito diferentes para exercícios completamente diversos (supino x agachamento).
Como pode ser visto na segunda tabela, as velocidades mínimas variam ligeiramente entre atletas, com os mais fortes sendo capazes de produzir as velocidades mínimas mais baixas (metade inferior da tabela). Talvez a capacidade de “sofrer” com uma velocidade mínima baixa seja devido à motivação e experiência com o exercício.
Tabela expandida da referência (28).
Tabela expandida da referência (28).
(N.T: IPF – International Powerlifting Federation. Federação Internacional de Powerlifting em português).
Para adicionar a isso, parece que a velocidade mínima de um exercício permanece a mesma, independente se o indivíduo ganha ou não força muscular (10, 18), mas não foi identificado se o mesmo é verdadeiro se o atleta perde força muscular.
No entanto, é importante lembrar que embora a velocidade mínima permaneça constante em repetições submáximas até a falha e uma repetição máxima (1RM), essas velocidades parecem ser diferentes para cada exercício e cada atleta.
(N.T: Em relação aos indivíduos, parece que as velocidades de determinado exercício são similares para mesmas populações).
Uma nota prática, em virtude dos limiares de velocidade mínima parecerem ser constantes entre testes máximos e submáximos, os profissionais podem usar essa informação para identificar se um atleta está ou não realmente tentando 1RM. Se ele sente que o atleta não está fornecendo um esforço verdadeiro para alcançar 1RM, talvez o uso do teste de repetições submáximas até a falha seja mais apropriado.
Novamente parece muito complicado, mas o perfil esforço físico-carga funciona de forma bem similar aos Limiares de Velocidade Mínima e de certa forma pode ser visto como uma simples extensão deles.
Nesse ponto você já compreende que o Limiar de Velocidade Mínima entre o teste de 1RM e a última repetição do teste submáximo de repetições até a falha são extremamente similares, senão o mesmo. Bem, o interessante é que a velocidade média concêntrica também parece ser constante para as “repetições na reserva” (isto é, as repetições deixadas no tanque) ao longo do espectro de velocidades (60, 65, 70 e 75% de 1RM) (24). Para tornar isso claro, a tabela a seguir demonstra como a velocidade média concêntrica permanece constante quando um atleta tem um X número de “repetições deixadas no tanque”.
(N.T: “Reps left in the tank”, uma expressão em língua inglesa significando aquelas repetições que ainda poderiam ser feitas se a série fosse de um esforço máximo).
Tabela adaptada das referências (5, 24).
Lembre-se que “repetições na reserva” significa quantas repetições o atleta deixou no tanque, ao olhar para a tabela acima se torna óbvio que se um atleta por exemplo deixou 9 repetições no tanque a velocidade média permanece razoavelmente constante, com um desvio de somente 0,02 m/s (destacado em verde).
O mesmo se aplica se ficaram 5 repetições no tanque (destacado em laranja). A figura abaixo demonstra a consistência das velocidades médias concêntricas e as repetições na reserva.
Em virtude dessa consistência, o preparador físico pode perceber quantas repetições o atleta ainda conseguiria fazer durante uma determinada série, assumindo que o atleta está realizando a série com o máximo esforço.
Por exemplo: Se o indivíduo alcança a velocidade média de 0,43 m/s durante o agachamento, o preparador pode estimar que ele tem aproximadamente 3 repetições no tanque (Tabela alguns parágrafos acima, destacado em vermelho) – presumindo, claro, que o atleta está empregando seu máximo esforço.
É importante lembrar que a velocidade média e as repetições na reserva podem variar entre exercícios e indivíduos, ressaltando a importância de construir perfis individuais. Embora os dados forneçam um ponto de referência, não se pode simplesmente usar estes perfis de velocidade, é necessário medir os indivíduos com os quais você trabalha.