Artigo que fala sobre um método de treino de força idealizado pelo preparador físico norte-americano Vern Gambetta chamado: O Espectro dos Agachamentos.
Uma nota geral de tradução: O termo “weight room” foi traduzido como “sala de treinamento com pesos”, mas poderia ter sido traduzido pelo nosso termo “sala de musculação”, não o fiz por achar que o termo sempre me remete a uma sala cheia de máquinas que, em geral, não é como nos Estados Unidos.
Já o termo “load” foi traduzido como “carga” no sentido de peso, resistência externa adicionada, ao agachamento neste caso. O termo “carga” de treinamento é mais amplo e engloba o todo que foi realizado dentro de uma sessão de treino.
Aos que não leram o artigo que deu origem a esta revisão e continuação: O Espectro do Agachamento.
Tenho usado o Espectro dos Agachamentos por algum tempo já. Faz 13 anos desde que Vern Gambetta escreveu a respeito. Sua sessão de exercícios irmã, o Circuito de Pernas ganhou muita força na comunidade de desenvolvimento atlético. Mas o Espectro dos Agachamentos permaneceu desconhecido. No artigo abaixo eu reintroduzi o conceito e expliquei porque eu o coloco em prática com meus atletas e pacientes.
A ideia básica é inspirada em Werner Günthör, Jean-Pierre Egger e Giles Cometti. Vern recomenda a seguinte sessão como ponto de partida:
O artigo original discute com esta sessão de exercícios tem como alvo potencial as fibras musculares do tipo II. Penso que os benefícios vão muito além da fisiologia muscular. O Espectro dos Agachamentos é um elemento chave na fundação da força muscular atlética e infraestrutura musculoesquelética.
Atletas de ensino médio altos do basquete e vôlei se beneficiam muito ao treinarem com a maior amplitude de movimento disponível com uma carga leve e velocidade. Nadadores hipermóveis aprendem a criar controle e rigidez nos membros inferiores.
Atletas acrobáticos do snowboard desenvolvem capacidade de trabalho nas extremidades inferiores ao adaptarmos o treino à duração de seu evento:
O Espectro de Agachamentos foi parte importante na preparação de Chloe Kim para os Jogos Olímpicos de Inverno de 2018 (N.T: Campeã olímpica de snowboard nessa mesma olimpíada na modalidade halfpipe, a mais jovem a ganhar uma medalha de ouro no snowboard, tinha 17 anos em 2018). Ela nunca fez agachamentos frontais ou com barra nas costas. Usávamos o levantamento terra com barra hexagonal, Meio Circuito de Pernas e o Espectro de Agachamentos como seus treinos primários de membros inferiores.
(N.T: A modalidade Halfpipe consiste em fazer manobras aéreas em uma estrutura em forma de meio cilindro, também usada no skate e com bicicletas. A modalidade Slopestyle consiste em manobras por sobre caixas, trilhos e rampas).
Vejamos em mais detalhes alguns benefícios chave desse tipo de sessão de exercícios.
Variação com propósito é fundamental para o desenvolvimento de pernas robustas e resilientes. Alguns dos aspectos que acho mais úteis no Espectro dos Agachamentos:
Fornecem um estímulo diferente em comparação aos exercícios de força mais tradicionais.
Existem atletas de todos os tamanhos e formas, com diferentes níveis de experiência e necessidades. O Espectro dos Agachamentos pode ser adaptado para qualquer um.
Agora que pegamos o que o Espectro do Agachamento pode fazer é hora de entrar em detalhes a respeito da aplicação.
Tenho errado de todas as maneiras imagináveis com a carga. Certifique-se que os atletas estejam confortáveis agachando e lidando bem com qualquer tipo de carga que estejam usando antes de usar algum tipo de carga com o Espectro de Agachamentos.
Não recomendo ultrapassar a recomendação original de 25 – 30% do peso corporal. Por favor varie o tempo de sustentação isométrico e número de repetições se deseja maior intensidade (N.T: Embora, ao meu ver, estas sejam variáveis de volume). Cargas mais pesadas vão levar ao stress desnecessário das costas. Tenho sido capaz de modificar com sucesso a carga e o volume para acomodar atletas que vão desde os 14 até os 69 anos de todos os níveis de habilidade.
Não há nada errado em modificar inicialmente a sequência para: Sustentação isométrica sem carga → Agachamento dinâmico sem carga → Agachamento com salto.
Frequentemente menos é mais em virtude de se obter maior velocidade e amplitude de movimento. O objetivo são movimentos repetidos feitos com excelência, não ficar moído, então adicionar carga e progredir até o espectro completo dos movimentos.
O Espectro dos Agachamentos é realizado no final da sessão de treinamento quando estamos na sala de treinamento com pesos e vai sendo construído em direção a temporada competitiva. Os atletas normalmente já fizeram dois levantamentos pesados pareados ou um só no início da sessão e quero que eles sejam capazes de expressar essa força muscular com controle e velocidade ao final da sessão de treino.
Eu tipicamente coloco o Espectro dos Agachamentos no começo ou no meio da semana, dependendo do número de variáveis. Os Circuitos de Perna são feitos ao final da semana. Gosto da ideia de finalizar a sessão e a semana com um desafio que tenha um propósito e algo que deixe o organismo em boa condição e revigorado.
Tipicamente começo com 3 séries e vou progredindo até 5 séries, com um descanso auto-selecionado entre as séries (N.T: Ou seja, o indivíduo escolhe o quanto descansar). Não faço uma progressão semanal em que vou adicionando séries ou reduzindo o tempo de descanso. Tudo depende do contexto. Meu intervalo de descanso mais agressivo é 1 minuto entre séries. De forma proposital não planejo nenhum descanso entre as séries e tentamos manter um fluxo contínuo de movimento.
O Espectro dos agachamentos funciona bem com 2 ou 3 pessoas treinando juntas, dependendo da proporção desejada entre trabalho:descanso, é fácil obter uma proporção de 1:1 ou 1:2 com duas pessoas treinando juntas ou grupos de três pessoas.
Eu aconselho a variar o tempo de sustentação isométrica e o número de repetições. A seguir algumas variações de tempo/repetições e você pode ver alguns vídeos no meu blog:
→ Sequência normal: Isometria 30 segundos – 6 agachamentos com carga – 6 agachamentos sem carga – 8 agachamentos com salto.
→ Opção para novatos: Isometria 30 segundos – 6 agachamentos com carga – 6 agachamentos sem carga – 3 agachamentos com salto.
→ Opção para atleta sênior: Isometria 15 segundos – 3 agachamentos com carga – 3 agachamentos sem carga – 3 agachamentos com salto.
→ Atleta em reabilitação (sem salto): Isometria 30 segundos – 8 agachamentos com carga – 8 agachamentos sem carga – sem salto.
→ Pré-competição / Baixo volume /Aquecimento: Isometria 10 segundos – 3 agachamentos com carga – 3 agachamentos sem carga – 3 agachamentos com salto.
→ Variação com alto volume para imitar um percurso de Esqui Downhill ou Super G: Isometria 45-60 segundos – 10 agachamentos com carga – 10 agachamentos sem carga – 10 agachamentos com salto.
Pode ser interessante averiguar os valores de acúmulo de lactato dos esquiadores nessa variação de maior volume.
(N.T: Segundo a Wikipedia. Em nível de competição, o esqui alpino consiste em percorrer um percurso descendente em velocidade, com passagens obrigatórias e entre estacas plantadas na neve chamadas “portas”. O objetivo é completar o percurso no menor tempo possível. A modalidade é disputada por homens e mulheres, nas categorias: downhill, slalom, slalom gigante, supergigante.
Além disso, existe um espaço de passagem obrigatória. E é justamente esse espaço que diferencia as categorias na modalidade:
Pré treino específico, série muito curta. Carga com menos de 15% do peso corporal.
Pré-temporada, difícil, quinta de 5 séries completas, final da semana. Carga com 30% do peso corporal.
Primeira vez, com 2 kettlebells, muito desafiador para os membros superiores. Carga com menos de 22% do peso corporal.
Variação de agachamento com desenvolvimento unilateral com kettlebell. Curto, possível ideia para o pré-golfe.
Pré-temporada, basquete. Carga de 35kg, 100kg de peso corporal.
Minha ferramenta de sobrecarga é o Bulgarian Bag (N.T: Saco búlgaro em português. Um saco de areia em um determinado formato, imagem abaixo). Mas qualquer sandbag (N.T: Saco de areia. Existem sacos de diversos formatos) funciona bem.
Barras hexagonais não funcionam para mim. Agachamento frontal com barra? Não. Barra nas costas? Sim. Halteres, sim, mas ajuda se é alguém experiente que consiga segura-los em uma posição confortável por 30 segundos (do contrários os 30 segundos parecerão uma eternidade).
Sacos de areia, Aquabags (N.T: Sacos contendo água, o mesmo princípio dos sacos de areia, embora os sacos com água forneçam uma carga mais instável. Imagem abaixo). Você pode atirá-los facilmente ao chão e dar prosseguimento à sequência dos agachamentos que não utilizam sobrecarga externa. Dica profissional: Um aquabag disponibiliza qualquer nível de intensidade e você pode escolher segurá-lo em um várias posições.
Ainda não explorei variações unipodais ou em outros planos com o Espectro dos Agachamentos (N.T: Sobre o assunto recomento a leitura deste artigo que aborda especificamente isto: Modificações Tridimensionais nos Exercícios). Tenho focado no plano sagital, com uma ênfase na profundidade (N.T: Sobre profundidade do agachamento temos de levar em conta a anatomia, sobre o assunto, sugiro este artigo: Variações no Quadril e o Agachamento), tempo e qualidade do movimento
Minha colega Taylor Lorbiecki, preparadora física da Academia da Força Aérea dos Estados Unidos atualmente está experimentando algumas variações usando o agachamento unilateral com suporte e o agachamento de base alternada. Penso que opções de certa forma unipodais são absolutamente viáveis e espero para ver os resultados de seu trabalho.
Espero que esse panorama geral dê aos profissionais algumas ideias a respeito do Espectro de Agachamentos de Vern Gambetta. Ele tem sido uma parte valiosa da minha programação e ajudou a redefinir minhas ideias a respeito de força muscular e como desenvolvê-la. Força muscular não se trata apenas de cargas pesadas e máxima produção de força. Se trata de mover-se com excelência repetidamente e esforço intenso sob condições variadas, com velocidade e controle.
Na minha programação atual uso o Espectro dos Agachamentos para complementar e fazer um rodízio em nosso trabalho tradicional de força ao longo do ano. Os atletas aprendem um pouco de auto-disciplina, sentem um senso de realização e constroem pernas mais fortes. A questão que se segue a meu ver é: O Espectro de Agachamentos pode efetivamente substituir o agachamento pesado tradicional?
Artigo original: Revisiting Spectrum Squats.