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Corrida Descalço – Partes 1 & 2

Por Marcus Lima em 12 de dezembro de 2019

Este é a versão para o blog de uma série adaptada há algum tempo para os que recebem a nossa newsletter. Ela foi escrita pelo pessoal da Universidade de Harvard, encabeçado por Daniel Lieberman, autor do best seller “A História do Corpo Humano – Evolução, Saúde e Doença”.

Se quiser acessar a versão em pdf do artigo click no link:

 

 

Biomecânica da Pisada & Aplicações para Correr Descalço ou em Calçados Minimalistas

Daniel E. Lieberman, Madhusudhan Venkadesan, Adam I. Daoud, William A. Werbel

Adaptação: Prof. Marcus Lima

 

Esta é a adaptação de um website que foi desenvolvido para fornecer um recurso baseado em evidências para àqueles interessados na biomecânica de diferentes tipos de pisada durante a corrida e as aplicações na corrida humana de resistência antes dos calçados modernos.

No laboratório de Daniel Lieberman (N.T: Skeletal Biology Lab) temos investigado a biomecânica da corrida de resistência, comparando corredores que habitualmente fazem suas práticas descalços com corredores que utilizam normalmente calçados modernos com amortecedores no calcanhar, solas mais rígidas e suporte para o arco plantar. Aqui está o resumo de nossos achados, que explicaremos com o recurso de imagens e vídeos.

Nossa pesquisa se perguntou por que e como humanos podem, e efetivamente conseguem, correr sem os tênis de corrida modernos. Testamos e confirmamos o que muitas pessoas já sabiam:

Pessoas que habitualmente correm descalças tendem a evitar a aterrissagem no calcanhar e, ao invés, aterrissam na parte anterior ou na parte central do pé

Grande parte de nossas pesquisas publicadas exploram a mecânica de colisão de diferentes tipos de aterrissagem. Mostramos que a maior parte daqueles que aterrissam com a parte anterior ou central do pé (calçados ou descalços) não geram os grandes e súbitos picos de impacto que ocorrem quando se aterrissa com o calcanhar (calçado ou descalço).

Consequentemente, corredores descalços que aterrissam com a parte anterior ou central do pé não precisam de calçados com amortecedores para lidar com essas grandes forças súbitas que ocorrem quando se aterrissa no solo.

Portanto, as pessoas que correm descalças, ou com calçados minimalistas, podem fazê-lo facilmente nas superfícies mais duras do mundo sem sentir desconforto. Se as forças de impacto contribuem para algum tipo de lesão, então o estilo de corrida (calçado ou descaço) pode ter alguns benefícios, mas essa hipótese ainda necessita ser testada.

Foot strike patterns and collision forces in habitually barefoot versus shod runners. Lieberman, D.E., Venkadesan, M., Werbel, W.A., Daoud, A.I., D’Andrea, S., Davis, I.S., Mang’eni, R.O., Pitsiladis, Y. Nature, 2010.

Endurance running and the Evolution of Homo. Bramble, D.M. e Lieberman, D.E. Nature, 2004. 432: 345-352.

Por favor note que não apresentamos nenhum dado de como as pessoas deveriam correr, que calçados causam determinadas lesões ou se correr descalço causa outros tipos de lesão. Acreditamos que existe uma forte necessidade de estudos prospectivos controlados sobre estas questões.

Esta série irá fornecer informação sobre:

  1. Evolução humana e corrida de resistência.
  2. Biomecânica do pé e membro inferior quando correr calçado.
  3. Biomecânica do pé e membro inferior quando correr descalço ou com calçados minimalistas.
  4. Diferenças biomecânicas entre aterrissar com o calcanhar e a parte anterior do pé.
  5. Ferramentas para auxiliar a avaliar os potenciais benefícios de aprender a aterrissar com a parte anterior do pé.
  6. Transição segura para a aterrissagem na parte anterior do pé quando estiver descalço ou com calçados minimalistas.

Por que Considerar o Modo de Aterrissagem?

Os seres humanos e nossos ancestrais recentes têm sido corredores de resistência por mais de 1 milhão de anos (Bramble e Lieberman, 2004). Nossas habilidades em corrida de resistência podem ter se desenvolvido para permitir aos nossos ancestrais perseguir a caça, muito antes da comparativamente recente invenção de tecnologias de projéteis usadas na caça (Carrier et al., 1984; Lieberman et al. 2009).

Nossa história evolucionária como corredores explica parcialmente porque o exercício aeróbico é um componente chave da saúde humana. Para a maior parte das pessoas, o exercício aeróbico envolve corridas de resistência, sejam corridas de baixa intensidade ou praticando esportes como futebol e basquete.

Infelizmente, estudos sugerem que ao menos 30% dos corredores se machucam a cada ano, e muitas dessas lesões vêm de problemas que se originam de lesões do pé e membros inferiores (van Gent et al., 2007).

Os seres humanos evoluíram para correr e antes dos anos 70 todos corriam descalços ou com calçados mínimos, como sandálias, mocassins ou calçados planos com sola fina. Uma predição básica da medicina evolucionária ou medicina Darwiniana (N.T: No site: evolutionarymedicine.org mais informações e recursos sobre o tema) é que o pé humano provavelmente é bem adaptado para correr descalço por longas distâncias.

Se for assim, então, contrário à crença popular, o pé descalço pode estar adaptado para correr longas distâncias sem precisar de calçados modernos, bem acolchoados, com amortecedores.

Não sabemos como os primeiros humanos corriam, mas nossa pesquisa (Lieberman et al., 2010) indica que seres humanos eram capazes de correr confortavelmente, e de maneira segura, quando descalços ou com calçados mínimos ao aterrissar com o pé plano (meio do pé) ou na parte anterior do pé antes de colocarem o calcanhar no solo (com o antepé). Essas formas de aterrissagem diferem profundamente daquela com o calcanhar, em termos de como o corpo se move e as forças resultantes no corpo.

A maioria dos corredores que usam os tênis de corrida padrão, normalmente aterrissam primeiro com o calcanhar no solo, mas nossa pesquisa sugere que a maior parte dos corredores que usam calçados minimalistas ou correm descalços aterrissam primeiro com a parte anterior do pé e as vezes com o meio do pé.

As próximas páginas contêm informações de como essas diferentes maneiras de aterrissagens diferem biomecanicamente e como são relevantes em relação a como as pessoas correm.

Assista o vídeo colocado no ar pela Nature Publishing Group (The Barefoot Professor – by Nature Video):


(N.T: O material a seguir não fazia parte do original, foi colocado a fim de contribuir com o tema exposto).

OBS: Descrições encontradas no ótimo livro de Daniel Lieberman: “A História do Corpo Humano: Evolução, Saúde e Doença (2015)”.

 

Características Evolutivas que auxiliaram a marcha (Adaptado de Bramble e Lieberman, 2004)

OBS: Os números entre parênteses referem-se à figura abaixo.

 

Inúmeras adaptações nos diferenciam dos nossos parentes chimpanzés, bem como dos primeiros hominídeos (assunto para nossos próximos artigos, cursos e workshops). Pelve mais baixa e lateralizada, adaptada para estabilizar a marcha, nos possibilitando nos deslocar por mais tempo com menor consumo energético,  é uma delas. Fiquem ligados no que vem por aí…

 

Confira a próxima parte da série: Tênis de Corrida Modernos & Batida de Calcanhar

 

Avaliação e Reprogramação da Marcha e da Corrida

 

Referências Bibliográficas

Bramble, D. M., Lieberman, D. Endurance running and the evolution of Homo. NATURE, VOL 432, 18 NOVEMBER 2004.

Carrier, D. R., Kapoor, A. K., Kimura, T., Nickels, M. K., Scott, E. C., So, J. K., Trinkaus, E. The Energetic Paradox of Human Running and Hominid Evolution. Current Anthropology, Volume 25, Number 4, Aug. – Oct., 1984.

Lieberman, D., Bramble, D. M., Raichlen, D. A., Shea, J. J. The First Humans – Origin and Early Evolution of the Genus Homo. Vertebrate Paleobiology and Paleoanthropology, 2009.

Lieberman, D., Venkadesan, M., Werbel, W. A., Daoud, A. I., D’Andrea, S., Davis, I. S., Mang’Eni, R., Pitsiladis, Y. Foot strike patterns and collision forces in habitually barefoot versus shod runners. Nature, 2010.

Lieberman, D. A História do Corpo Humano: Evolução, Saúde e Doença. Ed. Zahar, 2015.

van Gent, R. N., Siem, D., van Middelkoop, M., van Os, A. G., Bierma-Zeinstra, S. M. A., Koes. B., W. Incidence and determinants of lower extremity running injuries in long distance runners: a systematic review. British Journal of Sports Medicine, 2007.


Link do Artigo Original: Biomechanics of Foot Strikes & Applications to Running Barefoot or in Minimal Footwear.

Instituto Fortius