Um artigo de Gray Cook com uma reflexão sobre a importância da respiração.
Creio que este artigo encerra uma questão que deveríamos todos pensar a respeito (embora este não seja o foco do artigo), ao menos aqueles que operam dentro de uma perspectiva de qualidade do movimento: Os exercícios que propomos, especialmente aqueles que chamamos de “corretivos”, estão tendo uma transferência para o propósito que são empregados?
Os exercícios de mobilidade de ombro por exemplo, estão realmente aumentando a mobilidade do ombro? Só para ficar num exemplo. E se não estão, para que servem? Sobre esta questão, dia desses assisti uma palestra que o fisioterapeuta Charlie Weingroff deu para a equipe de Mike Boyle, e ele, dentre outras questões, abordou justamente isso. Para quem quiser assistir, aí vai o link: Charlie Weingroff: FMS System.
Boa leitura aos amigos.
A respiração é provavelmente a coisa mais simples ainda que mais complexa que fazemos. É algo consciente se quisermos que seja, mas no instante em que deixamos de pensar nela, ela continua por conta própria. Uma das grandes questões que nos desafia é: Quando ela continua por conta própria, como as coisas funcionam? Quando fazemos um exercício respiratório, estamos realmente modificando-a de alguma forma?
Pense a respeito da atual popularidade de exercícios de ativações musculares, digamos……ativação de glúteos. Qualquer um com um pouco de conhecimento de isolamento e da extensão do quadril, pode dizer se os glúteos foram ativados durante a sessão de treino.
Mas no momento em que o indivíduo se levanta e sai da sessão de treino, será que estes glúteos estão funcionando melhor do que antes?
Simplesmente porque criamos alguma atividade em uma situação isolada e temporária, será que esta atividade tem uma transferência para outras coisas que fazemos? Diabos, esta é a minha definição de função!!! Se você faz uma coisa, e esta coisa se transfere para muitas outras coisas, esta coisa é funcional. (N.T: A repetição nesse caso foi intencional).
Se você faz esta uma coisa e apenas vai se tornando cada vez melhor na sua execução, isto é, um treino específico, treino de uma atividade específica, treino desportivo específico, a especificidade da tarefa, etc.
Como qualquer outro exercício, isso também se aplica à respiração. Quando fazemos um exercício, precisamos nos perguntar se o exercício apenas melhora por si só (N.T: Ou seja, sua execução vai se aprimorando) ou se ele tem uma transferência para outras atividades.
Nesta discussão de respiração, eficiência na respiração e treinamento de respiração, minha primeira responsabilidade como profissional da saúde é iniciar com ela e não necessariamente com performance ou condicionamento físico.
A primeira consideração, largamente negligenciada, é se existe um problema estrutural. Existe alguma obstrução das vias aéreas? Existe um desvio de septo nasal? Existe algum fechamento ou vias aéreas anatomicamente pequenas?
Pense a respeito por um minuto. Quando uma pessoa tem uma postura horrível, com a cabeça anteriorizada, ombros arredondados e o peito afundado, o que acontece se esta é a postura onde anatomicamente as vias aéreas são maiores? Quando você assume uma postura militar, totalmente ereta e as vias aéreas tem 30 ou até 50% de sua capacidade comprometida, qual a motivação para permanecer nesta postura?
Em primeiro lugar – antes de iniciarmos com dicas posturais – devemos reconhecer se existe uma obstrução. Isso é um problema de saúde e o indivíduo provavelmente necessita que isso deva ser examinado.
Primeiro tiramos o problema anatômico das vias aéreas do caminho. Se você trabalha com clientes, e o que eu acabei de falar criou uma série de questões, ou se é um fisioterapeuta ou quiroprata e respiração não é a sua especialidade, um rápido histórico pode guiá-lo. Basta perguntar!
O indivíduo tem alergias sazonais? Congestionamentos nasais? Tosse com frequência? Tem ou teve episódios de bronquite? Tem chiado no peito quando respira? Em qualquer esforço, automaticamente passa a respirar pela boca? Tem a boca seca constantemente (outro sinal de respiração pela boca)?
Estas são coisas que imploram por uma investigação mais profunda antes de inserirmos um exercício para melhorar a respiração.
Em segundo lugar, muitos de nós tentam ativar músculos. Eu posso fazer os seus glúteos “queimarem”, mas se existe uma falta de extensão do quadril, você não usará seus glúteos de maneira eficiente na marcha ou em outras atividades (N.T: assim como a maneira como colocamos o pé na marcha, dependendo de como é esse primeiro contato o glúteo irá sofrer as consequências. Se falta eversão do calcanhar, como acontece com aqueles que tem o arco plantar alto, conhecido como pé cavo; se a marcha é com os pés excessivamente para fora, etc.).
Deixe-me dizer isso novamente: Não é nenhum problema fazer o indivíduo desempenhar uma ponte e seus glúteos irão “queimar”. No entanto, quando este indivíduo levantar e entrar naquela posição da amplitude final da extensão do quadril e sua cápsula articular se torna rígida, ele ativa um pouco mais seus flexores do quadril, afim de permanecer fora daquela amplitude final- para não bater a articulação contra o final da amplitude (N.T: Trocando em miúdos, para não sentir o desconforto da sensação de rigidez que aquela amplitude final da extensão do quadril produz. Assumindo uma posição de anteversão pélvica).
Os glúteos serão inibidos em muitas situações porque não se tem disponível a amplitude de movimento do quadril. E não porque eles não podem ser ativados, seria ineficiente uma ativação dos glúteos próximo da amplitude final de movimento em virtude de poderem ocorrer microtraumas e danos à articulação.
Deite no chão e ative os glúteos o quanto você quiser, mas será que haverá transferência para quando você ficar de pé?
O mesmo pode ser dito para um exercício de respiração. Podemos deitar e reproduzir exercícios respiratórios (N.T: Ele cita 2 exercícios: crocodile brathing e see-saw breathing) ou alguma atividade que desafie o controle motor, a fim de ativar os circuitos que permitem que os músculos intercostais, diafragma, abdominais, e outros que contribuem para a respiração, fazerem seu trabalho. Mas e se existir algum problema de mobilidade no caminho?
Deveríamos ter liberdade de movimentos no pescoço, cintura escapular e gradil costal. O assoalho pélvico e o diafragma trabalham em sincronia, então ter mobilidade no quadril e na pelve também é vantajoso. Se você está tentando treinar ou ensinar a respiração, tem de descobrir se existe alguma restrição significativa de mobilidade a bordo.
As 2 primeiras coisas que analisamos no FMS (N.T: Functional Movement Screen, ou Análise Funcional do Movimento em uma tradução livre), por causa de sua influência na respiração são: Mobilidade de ombros e a elevação da perna estendida (N.T: 2 dos 7 testes do FMS).
Mobilidade de ombros é mais do que apenas olhar para a amplitude de movimento do ombro. O teste nos deixa saber se o indivíduo consegue estender de maneira ativa sua coluna torácica. Nos permite saber também se existem restrições no gradil costal.
O mesmo ocorre com a elevação da perna estendida. A simetria e habilidade de elevar a perna em uma situação sem sobrecarga, nos diz bastante a respeito da pelve, do core e sobre a maneira como os quadris funcionam em conjunto.
Restrições a partir do pescoço através da pelve, podem interromper e restringir o ritmo natural que usamos na respiração. Se existe uma restrição, você deve pegar outro caminho e usar uma respiração fora de sincronia ou um padrão respiratório ineficiente.
Como sempre digo, mobilidade depois controle motor, ou mobilidade depois estabilidade. A ordem é: Mobilidade deve vir primeiro.
Se a mobilidade está em ordem, e ela não precisa ser perfeita, podemos seguir em frente. Mas, grande restrições no pescoço, coluna torácica, pelve, quadril e ombro, significam que: Se você está fazendo um exercício de respiração para usar o diafragma ou não usar tanto a parte superior do peito, você está perdendo o ponto do porque a respiração está ruim em primeiro lugar.
Tire da equação as grandes restrições de mobilidade antes. Eu tenho ajudado muitos atletas de resistência, através da melhora na mobilidade de ombros e da elevação da perna estendida. Não porque eu melhorei o transporte de oxigênio em nível celular, mas porque fiz com que a mecânica da respiração ficasse mais eficiente.
Você pode fadigar os músculos respiratórios, especialmente se está usando os músculos errados. O maior fator limitante em sua próxima corrida pode não ser a resistência localizada nos quadris e panturrilhas. Pode ser a resistência nos músculos respiratórios que são usados de maneira não apropriada e a falta de eficiência na mobilidade do tronco e parte superior do corpo.
(N.T: Um aparte no assunto: Muitos problemas que aparentam ser de falta de mobilidade são na verdade situações em que o controle motor/estabilidade não funciona adequadamente. Neste caso exercícios respiratórios/de estabilidade do tronco serão extremamente eficientes. A filosofia que mais me ajudou a avaliar e trabalhar nesses casos foi o Dynamic Neuromuscular Stabilization – DNS. Ver o banner abaixo).
Artigo original: Breathing.
Tópico muito importante, e do qual ainda sabemos muito pouco. Ao menos eu ainda sei muito pouco.