Artigo do Eric Cressey, preparador físico da área de Boston que trabalha muito com atletas de beisebol, especialmente com arremessadores, falando sobre o grupo muscular do manguito rotador.
Inseri diversas notas explicativas dos vídeos em inglês, a fim de facilitar a compreensão dos que têm um pouco de dificuldade com o idioma.
3 Pontos sobre a Prontidão do Manguito Rotador
Eric Cressey
Adaptação: Prof Marcus Lima
Ambas as instalações da Cressey Sports Performance estão cheias de jogadores de beisebol retornando para iniciar sua pré-temporada, então é a época do ano em que os atletas trabalham duro para retomar o controle do grupo do manguito rotador, antes que comecem os programas de lançamento de pré-temporada.
Isso dito, tenho pensado a respeito de alguns grandes princípios da prontidão do manguito rotador.
1 – Em um sentido amplo, cada exercício para o manguito rotador pode ser categorizado em uma de 5 maneiras:
a. Força muscular.
Esta consiste de trabalho com resistência manual e qualquer implemento, de cabos a halteres; é necessário que exista uma sobrecarga e que seja desafiador.
b. Timing.
Consiste de exercícios como a sustentação 90/90 e estabilizações rítmicas.
(N.T: A palavra “timing” nesse contexto poderia ser traduzida por “sincronicidade”. A sincronia de ativação desse grupo muscular).
(N.T: No vídeo ele explica que esse exercício visa reproduzir a função do manguito rotador em contrair de maneira reflexa para segurar a cabeça do úmero na cavidade glenóide.
E que esse não é um exercício em que se deva “sentir” alguma região, pela arquitetura desse grupo de músculos é muito difícil colocá-los em uma amplitude que nos permita ter a “sensação” de contração muscular, ainda, se o executante “sente” algo em geral esse “algo” é sinal de problemas. Em se tratando de uma população de arremessadores eles tendem a sentir a região da inserção da cabeça longa bíceps, na parte anterior do ombro.
O exercício em si consiste em em colocar o executante com o braço em uma determinada posição e pedir que ele o mantenha parado enquanto se aplicam estímulos rápidos em diferentes direções (como mostra a imagem acima). Uma última observação é que se o executante sentir a parte anterior do ombro talvez se esteja aplicando muita força na estabilização rítmica ou uma alavanca muito grande, diminua a resistência aplicada e a aplique mais próximo ao ombro).
c. Resistência.
Construída sobre o que vimos na primeira categoria (alguns dos mesmos exercícios), mas a resistência externa é um pouco menor e os exercícios são feitos com maior número de repetições ou por um período mais longo. O objetivo é menos em relação à força muscular e mais no sentido de treinar a capacidade de sustentar a cabeça do úmero na cavidade glenóide por um período maior de tempo.
Eu diria que é mais importante para um esporte como a natação do que para atletas de beisebol ou tênis.
(N.T: No vídeo o Cressey aponta alguns erros que são cometidos na execução de exercícios de rotação externa do ombro. Ele usa um meio rolo, ou pode ser uma toalha, qualquer coisa, para manter o ombro abduzido em 30° e um suporte para a cabeça. Alguns pontos importantes:
– O ombro que está em contato com o solo deve estar em uma posição neutra, e não encolhido.
– A escápula do ombro que vai executar o exercício não deve estar em uma inclinação anterior (ombro para frente) essa posição favorece o impacto no espaço subacromial (espaço entre o acrômio e a cabeça do úmero, como mostrado na imagem abaixo) e desfavorece o manguito rotador.
A escápula deve estar em uma posição de leve retração e inclinação posterior (favorece o manguito rotador).
d. Irradiação.
Pode ser referido a quase que qualquer exercício, já que o manguito rotador tem uma ativação reflexa sempre que o braço se move. Com isso dito, certos exercícios – como variações com o kettlebell virado para cima por exemplo (N.T Em inglês: kettlebell bottom up) – são particularmente úteis ao desafiar essa categoria de exercícios.
(N.T: A irradiação é um princípio do FNP – Facilitação Neuromuscular Proprioceptiva, dita que a ativação distal tem um reflexo proximal, nesse caso, a preensão manual tem um reflexo, uma irradiação, de ativação no ombro, mais precisamente no manguito rotador).
(N.T: Ele usa esse exercício com um ângulo de flexão do ombro entre 80-110°, e alerta que muitos irão usar a cabeça longa do bíceps braquial para fazer o trabalho da flexão do ombro e acabam sentindo a parte anterior do ombro no exercício.
O que ele faz nesses casos é reposicionar manualmente a escápula em rotação superior e inclinação posterior – imagem acima.
Com a mão esquerda ele está fazendo a inclinação posterior da escápula e com a direita a rotação superior. Esse reposicionamento manual pode ser usado em outros exercícios em que o ombro participa, ao se levantar um peso, por exemplo.
Uma outra saída é usar uma regressão de menor flexão do ombro (braço mais baixo).
Ainda, se pode abduzir mais o ombro (braço mais para fora) ficando mais alinhado com o chamado plano escapular.
Outros podem responder a uma estratégia mais global de controle do core, em virtude da postura estar interferindo no complexo do ombro – pelve com inclinação anterior, lombar em extensão, gradil costal projetado à frente em um posicionamento com direção cranial).
e. Padronização.
Exercícios que fazem com que o úmero alcance sua amplitude total de movimento. De particular importância (N.T: Para arremessadores de beisebol, que é a população que o autor mais trabalha. Embora possa ser adaptado a outras populações esportivas que usam grandes amplitudes na glenoumeral) é a amplitude final de rotação externa do ombro, que treinamos com exercícios como este:
2. Eu prefiro uma exposição quase diária ao invés de programas exaustivos com menor frequência.
Se você analisar nossos programas de treinamento, a maior parte dos nossos atletas profissionais estará fazendo algum treino com foco no manguito rotador 5-6 vezes na semana. 2x por semana fazemos um trabalho mais concentrado em força muscular e irradiação e 2x/semana cobrimos exercícios que trabalhem o timing.
Embora quase todos os dias façamos algum tipo de exercício que use o padrão que eles precisam, para que assim lembremos o grupo de músculos do manguito rotador do que eles precisam fazer.
Essa abordagem é um grande contraste com o que normalmente vemos no mundo do beisebol, que é notório por distribuir rotinas de cuidado com o braço 2x/semana que levam de 45-60 minutos.
Normalmente são cerca de 15 exercícios de múltiplas séries e deixam o atleta com o braço extenuado ao final da sessão.
Penso que essa abordagem tem mais a ver com o fato de se alinhar com o que é conveniente em sessões de fisioterapia de 2-3x/semana do que por ser verdadeiramente ideal. Sou da crença que você não precisa (ou queira) exaurir o manguito rotador para chegar onde deseja.
E, enquanto estamos nesse assunto, se o manguito é requerido em uma base diária com os arremessos, levantamentos de peso, atividades da vida diária, por que não dar uma exposição mais frequente a fim de construir um pouco de resiliência do tecido?
3. Deltóide posterior não deveria ser confundido com o infraespinal e o redondo menor.
Muitas vezes a razão por termos desconforto ou a sensação “estranha” nos exercícios é em virtude dos atletas estarem prestando muita atenção na osteocinemática da articulação em questão – movimentos de rotação externa/interna, flexão/extensão. adução/abdução, e não prestando atenção na artrocinemática da mesma articulação.
(N.T: Em termos gerais a osteocinemática descreve o movimento dos ossos em relação aos 3 planos do corpo – sagital, frontal e transverso)
(N.T: Já a artocinemática descreve o movimento que ocorre entre as superfícies articulares. Segundo Neumann em seu livro “Cinesiologia do Aparelho Musculosquelético, 2011” existem 3 movimentos fundamentais entre superfícies articulares curvas – rolamento, deslizamento e giro).
Em outras palavras, o rolamento e deslizamento da articulação glenoumeral (N.T: a imagem abaixo mostra a artrocinemática da articulação glenoumeral durante a abdução ativa) tem de ser controlado dentro de uma janela apertada para assegurar o movimento ideal.
Nas variações de rotação externa do ombro, a cabeça do úmero tende a deslizar anteriormente na cavidade glenóide. Os ligamentos glenoumerais (cápsula anterior do ombro), o manguito rotador e o tendão bicipital são as únicas coisas que podem sustentar o úmero na cavidade.
Na população de arremessadores a cápsula é normalmente um pouco frouxa e o manguito um pouco fraco, portanto o tendão do bíceps braquial frequentemente tem de assumir o fardo – e é por isso que alguns acabam sentindo a parte da frente do ombro, fortalecendo, portanto, um mau padrão.
Também existem muitos nervos na parte anterior do ombro que podem acabar irritados.
Agora as coisas ficam mais complexas. O infraespinal e o redondo menor fazem parte do manguito rotador e se inserem diretamente na cabeça do úmero, portanto eles podem controlar a artrocinemática (deslizamento posterior) durante a rotação externa da articulação glenoumeral.
Inversamente, o deltóide posterior (em azul na imagem abaixo) se insere na parte posterior da espinha da escápula até o tubérculo deltóideo. Em outras palavras, ele não controla a cabeça do úmero.
Com isto em mente, o deltóide posterior na realidade cria um deslizamento anterior da cabeça do úmero na medida em que roda externamente e abduz horizontalmente o braço. Por essa razão, você precisa se assegurar de que o braço não faça uma abdução horizontal durante os exercícios de rotação externa. O vídeo abaixo deve clarear as coisas se você aprende melhor visualmente.
(N.T: No vídeo acima o autor dá algumas orientações quanto ao exercício de rotação externa do ombro no cabo – exercício muito comum usado na reabilitação, seja usando o cabo ou elásticos.
– É comum que haja uma anteriorização da cabeça do úmero nesta posição de exercício, colocando stress no tendão da cabeça longa do bíceps braquial.
– Neste exercício o único movimento que deve existir é a rotação, uma dica verbal seria: “Imagine que um ferro está cravado ao longo do membro, como um eixo, permitindo somente a rotação”. Esse eixo imaginário está representado pelo traço vermelho na imagem acima.
– Garantir que seja mantido o centramento articular ideal. O conceito de centramento articular está bem descrito em outro artigo neste espaço chamado “O que é o DNS – Parte 1”).
Se estiver procurando mais dicas como essas confira meu novo material: Sturdy Shoulder Solutions.
Artigo Original: 3 Random Thoughts on Rotator Cuff Readiness.