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Força??? Parte 2

Por Marcus Lima em 07 de janeiro de 2015

Segunda parte do controverso artigo do Gray Cook, onde ele desafia o significado da palavra “Força”, como disse na introdução da parte 1, cada um que julgue se a ideia tem ou não seus méritos.

Aos que não leram a adaptação da primeira parte: Força?

 

Força Definida.

Gray Cook

 

Nossa discussão prévia a respeito do significado de “Força”, terminou com um desafio para desenvolvermos uma definição melhor e mais aplicável da palavra.

Quando olhamos para a definição da palavra postada pelo dicionário Merriam-Webster para Força, indicando um substantivo, o primeiro significado é:
“Qualidade ou estado de ser forte, capacidade para o esforço ou resistência.
Se olharmos mais fundo para “esforço” e “resistência”, acabaremos usando as palavras “Capacidade de Trabalho”.

A razão pela qual eu desafiei a palavra força em primeiro lugar, foi porque me vi trabalhando com Lee Burton e Dan John no dvd “Essentials of Coaching and Training Functional Continuums” e pegando comentários de preparadores físicos como John Torine e Alwyn Cosgrove a respeito do conceito de força. Penso que podemos ter um padrão melhor de comunicação e responsabilidade se empregarmos a palavra força da forma que proponho, ao invés de a vermos como uma série de levantamentos com peso.

A menos que se esteja levantando peso por esporte (N.T: Referindo-se aos esportes onde o peso é o ator principal: powerlifting, fisiculturismo, strongman, levantamento de peso olímpico, etc.), as pessoas levantam pesos para obterem algum benefício.

Quer seja pelo condicionamento físico, preparação para algum esporte, algum hobby ou atividade física, deveríamos concordar que capacidade de trabalho irá permitir desenvolver mais habilidades porque se tem mais resistência à fadiga – o tempo de prática não será preenchido apenas com volume, mas com integridade também.

Se você pudesse testar capacidade de trabalho sem usar pesos, então poderia fazer um grande caso para o levantamento. Se você precisa levantar pesos para testar a capacidade de trabalho, eliminaria alguns caras fortes que não levantam pesos. Se você necessita levantar pesos com boa técnica, então eliminaria um monte de ratos de academia também.

Você faz um teste para saber o que praticar — não para praticar o teste.

Quando Dan John e eu abordamos este tópico no DVD Essentials of Coaching and Training Functional Continuums, a área em que houve mais obstáculos e pontos de controvérsia foi o fato de que depois de adquirirmos competência usando o próprio peso corporal, depois competência nos padrões de movimento, progredimos para um padrão com carga.

Biologicamente, não é o que acontece. Bebês carregam coisas antes de tentarem levantar sua carga máxima. Levantamentos sub-máximos carregando coisas, são preferidos pela natureza e pelo desenvolvimento biológico ao invés de simples repetições de levantar coisas em padrões de movimento recém adquiridos.

fazendeiro exercendo sua capacidade de trabalhoQuando pessoas com um padrão disfuncional no seu FMS (N.T: Functional Movement Screen) executam uma estratégia corretiva e imediatamente fazem algum levantamento que se pareça com o padrão disfuncional, há um “soluço”. Se eu fiz alguma coisa para contribuir com esse pensamento, peço desculpas publicamente, porque não deveríamos impor cargas arbitrariamente em um padrão que foi vetado pelo peso corporal.

(N.T: Ou seja, se o padrão sem carga é ruim, é desaconselhável colocar carga em cima. O agachamento é o exemplo mais comum, se alguém não agacha bem com o peso corporal, sem sobrecarga alguma, não seria a melhor ideia coloca-la para agachar com sobrecarga ou em uma smith machine).

Deveríamos ver como se parece sua resistência e integridade sob carga, em movimentos de baixa complexidade como o fazendeiro, o carregamento na posição de “rack”, o carregamento acima da cabeça (N.T: Muitos desses exercícios conhecemos por seu nome em inglês, já que a tradução é livre. No original: Farmer’s walk, Front rack carry e Overhead carry respectivamente) ou partes do turkish get up ou até mesmo fazê-lo completo.

Se pudermos demonstrar competência nesses carregamentos (N.T: Se refere a esses exercícios em que se tem de segurar uma carga em diversas posições. O termo inglês é “carry”, portanto a tradução será “carregamentos”) verticais e horizontais, então penso que podemos demonstrar o quanto a integridade irá durar sob carga.

 

Y-Balance Test

A partir dessa base de “carregamentos”, podemos perseguir os levantamentos apropriados que façam com que o indivíduo seja equilibrado em relação à capacidade de trabalho: direita-esquerda, anterior-posterior, superior-inferior (N.T: Refere-se à diminuição de assimetrias). Quando buscamos um corpo equilibrado, o dividimos em quadrantes. Veja o Y-Balance Test e descobrirá de onde tiramos isso.

Teste de equilíbrio Y - Y-Balance Test.(N.T: Y-Balance Test: Ferramenta que avalia o equilíbrio dinâmico e tem sido proposta como um meio de avaliarmos riscos de lesões. Divide o corpo em 4 quadrantes: membro superior direito e esquerdo, membro inferior direito e esquerdo. Em cada um dos 4 quadrantes o indivíduo procura alcançar o máximo possível em 3 direções, como vemos nas fotos acima. A partir da distância somada alcançada, usam-se esses dados para analisar os riscos de lesões. Existe um teste similar ao Y-Balance chamado “Star Excursion Test”).

(N.T: Abaixo um vídeo, em inglês, mostrando a execução do Star Excursion Test).

Eu desafiei a palavra “Estabilidade”, em meu livro Movement, há um tempo atrás, dizendo que o significado que dávamos a palavra “Estabilidade” na verdade significava “Força” – séries e repetições para pequenos grupos musculares.Isso não é estabilidade.

Estabilidade tem mais a ver com sincronicidade (N.T: Sincronicidade, do inglês “timing”) do que com força, funcionaria bem se atribuíssemos o significado de “controle motor”. Isso ajudaria a dar um significado mais preciso, porque quando vemos uma falta de controle motor, tomamos ações que o criam. Quando encontramos uma falta de estabilidade, muitas vezes simplesmente nos perguntamos que grupo muscular controla este movimento e quantas séries e repetições pensamos que devemos fazer para recuperar esta estabilidade.

Quantas séries e repetições de flexão do dedo você acha que é suficiente para tocar piano?

Ray charles tocando piano

Não existe resposta porque essa é uma pergunta errada. Tocar piano cria uma sincronicidade e coordenação que cria o controle motor responsável por tocar piano. Não diz respeito a força em nível de controle motor. Diz respeito a alinhamento com integridade sob carga.

Isso é o que os “carregamentos” fazem – quase automaticamente, se a postura é a correta. Se a postura inicial é a correta, seu trabalho é manter o exercício entre 1 e 3 minutos. Ajuste as cargas apropriadamente. Ajuste apropriadamente a postura. Tenha certeza de não possuir nenhum escore “1” no FMS.

(N.T: O escore 1 indica uma disfunção naquele padrão em particular do Functional Movement Screen. O escore 1 é atribuindo a quem não consegue executar o movimento do teste).

Se existe algum, você provavelmente tem um problema de controle motor ou um problema oculto de mobilidade. Se for um de mobilidade, não deveria nem ao menos estar perseguindo controle motor até que saiba qual é o problema (N.T: Isso porque Gray Cook acredita que se deva resolver os problemas de mobilidade antes de se deter no controle motor. Para ele não existe controle motor sem a presença de mobilidade. Outra corrente declara que a falta de mobilidade é possivelmente causada por falta de controle motor. Na incapacidade de controlar um movimento o sistema nervoso central o restringe).

Se matarmos a palavra “estabilidade” e a substituirmos por “controle motor” e matarmos também a palavra “força” e a substituirmos por “capacidade de trabalho”, então espero que ninguém se sinta ofendido. O ponto que estou tentando demonstrar, é o de não criar uma palavra que seja como um bezerro de ouro (N.T: Alusão à famosa estória bíblica ocorrida na saga do povo Hebreu em busca da terra prometida), deixando-a se tornar algo pelo que nos esforçamos para obter.

Capacidade de trabalho é o que buscamos em nossos empreendimentos humanos, e força é um atributo chave que auxilia à capacidade de trabalho. No tempo e lugares certos, levantamentos com peso são uma das coisas mais eficientes para promover capacidade de trabalho, mas se esses levantamentos criam efeitos colaterais inapropriados ou de alguma forma minam a capacidade de trabalho, então força é uma palavra vazia. Qualquer um pode dizer que a possui.

Vamos proteger a nobreza de palavras como “força” e “estabilidade”. Por um curto período, vamos impor um título mais correto para o que queremos obter ao fazer um trabalho de força ou trabalho de estabilidade. Chamemos de “controle motor” e “capacidade de trabalho”. Não nos escondamos atrás de termos que não possuem métrica e o valor que nos permita demonstrar nossa melhora ou efetividade em um atributo, sem efeitos colaterais desnecessários.

Espero não ter ofendido ninguém. Se eu desafio as pessoas a pensarem fora da caixa, é o mesmo desafio que me imponho quando começo a confrontar estes termos, tentando ser mais verdadeiro comigo e com o trabalho que realizo.


Artigo original: Strength Defined.

Instituto Fortius